Quem se interessa por investimentos em ações e começa a pesquisar sobre o assunto invariavelmente se depara com duas visões: a análise técnica (ou gráfica) e a análise fundamentalista.
Quando iniciei meus investimentos em ações eu escolhi o caminho da análise técnica. Mal sabia o erro que estava cometendo.
Por ser formado na área de exatas, eu acreditava que seria moleza investir utilizando gráficos, indicadores e detectando padrões. No início eu até tive algum sucesso (o que é terrível por sinal). Mas, logo depois de um tempo, minhas operações começaram a dar errado.
Admito, cometi diversos erros, principalmente por conta de desvios comportamentais, mentalidade errada e péssimo controle de risco. E sim, perdi bastante dinheiro!
Quase me afastei do mercado, chamando tudo de cassino, culpando os tubarões, os políticos, a CVM, a corrupção, etc. Contudo, eu superei essa fase depois que tomei a decisão de me desenvolver como investidor.
Comecei a ler livros, fazer alguns cursos e acompanhar conteúdos de valor na internet. Descobri que para investir em boas empresas, com horizonte de longo prazo, iria precisar de uma metodologia inteligente.
Eu definitivamente precisava estudar sobre análise fundamentalista.
Você vai aprender neste artigo:
- O que é análise fundamentalista
- Qual o significado das abordagens top down e bottom up
- Quais estratégias de análise fundamentalista existem
Índice de Conteúdo
O que é Análise Fundamentalista?
A análise fundamentalista é uma maneira de analisar investimentos, partindo da ideia de que o retorno do mesmo é determinado pelo desempenho operacional da empresa (ou seja, os fundamentos), e não por movimentos do mercado, por bolhas especulativas, pela aversão ao risco dos investidores, ou qualquer outro fator que tenha origem no mercado financeiro.
A análise fundamentalista sustenta que o mercado deverá, no longo prazo, refletir a lucratividade (ou prejuízo) da empresa, fazendo a ação convergir para seu preço justo.
Essa é uma abordagem oposta à análise gráfica ou técnica, segundo a qual a melhor estratégia para investir em ações é analisar os movimentos do mercado, independentemente dos fundamentos da empresa. Pela visão fundamentalista, um investidor racional deve necessariamente, fazer uma análise financeira e operacional da empresa.
A análise financeira é feita principalmente através dos demonstrativos financeiros que a empresa é obrigada a divulgar trimestralmente. Ela possibilita ao investidor ver a solidez da empresa, sua capacidade de pagar fornecedores, seu endividamento, e claro, se ela está tendo lucro ou prejuízo.
Já a análise operacional é mais qualitativa e abrangente, e envolve o estudo do setor em que a empresa atua, seu posicionamento no mercado, suas estratégias de crescimento, bem como uma visão geral da concorrência.
Esse tipo de análise torna possível estimar se a empresa tem boas ou más perspectivas de lucrar no futuro.
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Análise fundamentalista e o Valuation
Para um analista fundamentalista, o preço de uma ação de mercado tende a se mover em direção ao seu “valor intrínseco“, que é o “verdadeiro valor” de uma empresa, calculada por seus fundamentos.
Se o valor de mercado não corresponde ao verdadeiro valor da empresa, há uma oportunidade de investimento.
Juntando todas as informações, é possível estimar o quanto uma empresa vale atualmente. Esse processo é chamado de valuation, e será tratado em mais detalhes futuramente. O valuation envolve, obviamente, um grau de incerteza e subjetividade, já que não é possível saber se as perspectivas futuras irão ou não se concretizar.
Apenas após analisar uma empresa é que o investidor fundamentalista busca saber a cotação de mercado, ou seja, qual o valor que o mercado atribui atualmente à empresa.
Se esse valor for significativamente mais baixo do que aquele estimado pelo investidor, se houver uma margem de segurança e se a empresa for financeiramente sólida, conclui-se que o investimento traz um bom potencial de ganho.
Leia também:
- Valor Intrínseco: Como estimar o valor de um ativo
- Margem de Segurança: O colchão de segurança do investidor em valor
Por que usar análise fundamentalista?
Análise fundamentalista é construída sobre a ideia de que o mercado o preço das ações de uma empresa estará avaliado de forma errada de vez em quando.
A relação risco x retorno é compensada encontrando ativos subavaliados e esperando o mercado ajustar a avaliação da companhia.
Ao analisar os relatórios financeiros das empresas, você terá uma compreensão do valor de diferentes empresas. Depois de analisar esses fatores você poderá ter uma melhor compreensão se o preço do ativo estará subavaliado ou sobrevalorizado ao preço de mercado atual.
A análise fundamentalista também pode ser realizada numa base setorial e na economia como um todo.
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Abordagens Fundamentalistas: Top-down e Bottom-Up
Os investidores que usam a análise fundamentalista podem usar abordagens top-down ou uma abordagem bottom-up.
Abordagem Top-down
O investidor “top-down”, ou “de cima para baixo” começa sua análise com a economia global, incluindo tanto os indicadores econômicos nacionais e internacionais; tais como as taxas de crescimento do PIB, inflação, taxas de juros, taxas de câmbio, produtividade e preços da energia.
Eles posteriormente estreitam sua busca para análise regional / setorial das vendas totais, níveis de preços, os efeitos dos produtos concorrentes, a concorrência estrangeira, e a entrada ou saída da indústria. Só então eles refinam sua busca para o melhor negócio na área em estudo.
O conhecimento do ciclo de negócios na economia é um dos objetos de estudo dessa abordagem. Em linguagem mais simples, o aumento e diminuição da economia.
O ciclo de negócios pode ser dividido basicamente em 4 etapas:
- Expansão: aumento da atividade empresarial sob a forma de vendas, salários, produção industrial, aumento dos preços das ações e dos valores das propriedades, aumento da procura dos consumidores e do PIB.
- Pico: a crista da expansão, a partir da qual ponto a economia começa a abrandar.
- Contração: marcada por um abrandamento do crescimento e da produção. Definido como dois trimestres consecutivos de contração do PIB, uma recessão é uma contração de curto prazo. Uma versão mais severa é conhecida como uma depressão. Aumento dos padrões de inadimplência e falências, alto endividamento dos consumidores, aumento do estoque e queda do PIB são todos indicadores de um declínio.
- Ponto de virada: o fim de um declínio na atividade comercial e o início de uma reviravolta.
Os fundamentalistas dessa abordagem também analisam as políticas econômicas (tanto monetária quanto fiscal), a balança comercial, índice de emprego, o orçamento do governo e as decisões de financiamento, que podem gerar por exemplo:
- Gastos públicos elevados
- Aumento dos impostos sobre os combustíveis e a energia (que tendem a diminuir a atividade econômica)
- Déficit ou Superávit orçamentário federal. Os déficits podem aumentar o custo dos fundos e eliminar os empréstimos privados até certo ponto.
Conhecer e compreender o estado atual da macroeconomia é importante, pois permite ao analista enquadrar o pano de fundo contra o qual avaliar as fortunas de uma empresa ou indústria.
Algumas fases do ciclo econômico beneficiam certas empresas, enquanto outras não.
Abordagem Bottom-up
O investidor “bottom-up”, ou de “baixo para cima” começa com empresas específicas, independentemente da sua indústria/região e prossegue no sentido inverso da abordagem top-down.
Este ramo da análise fundamentalista considera os fundamentos de uma empresa de diversas perspectivas, incluindo suas demonstrações financeiras, qualidade de gestão, produto ou serviço, onde se situa em sua respectiva indústria, seus fornecedores e concorrentes, etc.
Essa abordagem busca indústrias e empresas que representem oportunidades promissoras no contexto do ciclo econômico. Diferentes indústrias reagem de forma diferente em várias fases do ciclo econômico.
Por exemplo, podemos citar três tipos de indústrias que reagem de forma diferente aos ciclos econômicos:
- Indústrias defensivas – as empresas nessas indústrias são menos suscetíveis aos caprichos do ciclo econômico. Os bens de consumo não duráveis, como alimentos e tabaco, são exemplos de indústrias que tenderiam a sobreviver a uma desaceleração na economia melhor do que as indústrias cíclicas ou de crescimento, mas também oferecem um pouco menos de crescimento nos mercados em alta.
- Indústrias cíclicas – são altamente sensíveis aos ciclos de negócio e às tendências da inflação. Aço, bens duráveis e automóveis são exemplos. As recessões tendem a amortecer a demanda por automóveis e construção, o que afetaria a produção de aço.
- Indústrias em crescimento – crescem mais rápido do que a economia, devido a novas oportunidades. Podemos citar a biotecnologia e vários sub ramos da indústria de supercondutores e tecnologia, por exemplo. Essas empresas tendem a investir pesado em pesquisa e desenvolvimento, operam com caixa negativo por um tempo e pagam pouco ou nenhum dividendos.
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7 Estratégias que usam Análise Fundamentalista
A análise fundamentalista pode ser utilizada dentro de diferentes estilos de estratégias e gestão de carteiras.
Confira a seguir uma lista de 7 estratégias que utilizam essa metodologia.
1 – Buy & Hold
A estratégia “Comprar e Segurar” (ou “Buy & Hold” em inglês) é uma abordagem de investimento de longo prazo em que os investidores compram ações, títulos ou outros ativos e os mantêm por um período estendido, independentemente das flutuações de curto prazo no mercado.
Nessa estratégia, o foco está em manter uma carteira relativamente estável ao longo do tempo, sem se preocupar com movimentos de preços de curto prazo ou indicadores técnicos.
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2 – Investimento em valor
Nessa estratégia os investidores focam a sua atenção para as empresas subavaliadas pelo mercado, acreditando que o valor intrínseco do negócio é maior do que o valor de mercado. Os estudos que eles realizam derivam da análise fundamentalista.
As ações de empresas que estão com preços abaixo do seu valor intrínseco são comumente chamadas de ações de valor (do inglês, value stocks). Essas são os alvos dos investidores em valor que lidam com essa estratégia de investimento, ou seja, comprar com preços descontados.
Entenda melhor:
3 – Timing (pontos de entrada)
As ferramentas de análise fundamentalista podem ser usadas para avaliar empresas em condições boas ou ruins. O preço das ações das empresas que estão indo mal irá flutuar, criando oportunidades de entrada.
Investidores atentos podem aproveitar essas flutuações para comprar ações a preços mais baixos, esperando uma recuperação futura. Dessa forma, a análise fundamentalista não só ajuda a identificar empresas subvalorizadas, mas também a determinar os momentos mais estratégicos para investir.
4 – Ciclos econômicos
A análise fundamentalista pode ser usada considerando o ciclo econômico para determinar se as condições ideais para comprar empresas fundamentalmente adequadas.
Ao entender em que fase do ciclo econômico estamos, os investidores podem identificar momentos propícios para adquirir ações de empresas sólidas a preços atrativos. Durante períodos de recessão, por exemplo, muitas ações podem estar subvalorizadas, oferecendo boas oportunidades de compra para aqueles que têm uma visão de longo prazo.
Assim, a análise fundamentalista, aliada ao conhecimento dos ciclos econômicos, pode ser uma ferramenta poderosa para maximizar os retornos dos investimentos.
5 – Investidores contrários
Os “contrarian investors” afirmam que “a curto prazo, o mercado é uma máquina de votação, não uma máquina de pesagem”. Ao utilizar a análise fundamentalista, o investidor contrário consegue realizar a sua própria decisão sobre o valor, ignorando as opiniões do mercado.
Esses investidores buscam oportunidades onde veem discrepâncias entre o preço atual das ações e seu valor intrínseco, muitas vezes comprando quando outros estão vendendo. Dessa forma, eles confiam em suas próprias análises e convicções, em vez de seguir a tendência do mercado, o que pode levar a retornos significativos a longo prazo.
6 – Ações de crescimento
A análise fundamentalista pode ser utilizada para determinar as taxas de crescimento futuro para a compra de ações de crescimento com preços elevados.
Em finanças, uma ação de crescimento (do inglês, growth stocks) é uma ação de uma empresa que gera um fluxo de caixa positivo substancial e sustentável e cujas receitas e ganhos devem aumentar a uma taxa mais rápida do que a média de uma empresa do mesmo setor.
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7 – Análise quantitativa
Por último, a análise fundamentalista pode ser utilizada juntamente com fatores técnicos em modelos de computador, conhecidos como análise quantitativa.
O investimento quantitativo, também chamado de investimento sistemático, é uma abordagem que utiliza modelagem matemática avançada, sistemas de computador e análise de dados para calcular a probabilidade ideal de execução de uma negociação lucrativa.
Essa metodologia permite aos investidores tomar decisões baseadas em dados concretos e padrões identificáveis, minimizando o impacto de emoções e opiniões subjetivas no processo de investimento.
Combinando a análise fundamentalista com técnicas quantitativas, os investidores podem desenvolver estratégias mais robustas e potencialmente mais rentáveis.análise fundamentalista pode ser utilizada juntamente com fatores técnicos em modelos de computador (análise quantitativa).
Análise Fundamentalista: Fatores Qualitativos
Não somente de números é formada a análise fundamentalista.
Vários fatores qualitativos podem ser facilmente obtidos a partir de informações públicas sobre a empresa de interesse. Um sistema adequado de Governança Corporativa que adote princípios de integridade e divulgações transparentes mitigará os riscos de comportamento fraudulento.
A integridade das demonstrações contábeis corporativas e o monitoramento do comportamento da administração estão correlacionados com retornos positivos das ações a longo prazo.
Outras considerações qualitativas podem incluir o quão bem a empresa se adapta às mudanças sociais, tecnológicas, econômicas e políticas.
Empresas com fortes conexões políticas podem ser severamente prejudicadas quando esse sistema de suporte é removido. Da mesma forma, se uma empresa é totalmente dependente de um fenômeno social atual (como um modismo) ou de uma única tecnologia, mudanças nessas variáveis podem prejudicar a empresa.
Esse tipo de análise costuma ser mais difícil do que a análise baseada em fundamentos porque requer a criação de hipóteses que não podem ser respondidas com facilidade.
Recomendo a leitura:
- Círculo de Competência: Escolha investimentos que você entenda
- 7 Habilidades para se Tornar um Investidor Melhor (a #4 é a mais difícil)
- Hipótese do Mercado Eficiente: 7 Razões para não acreditar nela
Conclusões
A análise fundamentalista é tudo que envolve a obtenção de um entendimento de uma empresa, a saúde de seus negócios e suas perspectivas futuras.
Um investidor que utilize desse método faz a leitura e análise de relatórios anuais e demonstrações financeiras para obter uma compreensão das vantagens comparativas, os concorrentes da empresa e do seu ambiente de mercado.
A análise fundamentalista pode ser utilizada dentro de diferentes estilos de estratégias e gestão de carteiras. Neste artigo foram vistas 7 estratégias:
- Buy & Hold
- Investimento em valor
- Timing (pontos de entrada)
- Ciclos econômicos
- Investidores contrários
- Ações de crescimento
- Análise quantitativa
Existem alguns outros fatores a serem considerados, mas essencialmente o investidor fundamentalista procura comprar uma ação por um preço abaixo do que ela realmente vale, sabendo que no longo prazo, o mercado deverá reconhecer esse valor justo.
Embora a análise fundamentalista seja focada em números, como índices e previsões de receita sejam, sem dúvida, vitais para as decisões de investimento, a análise qualitativa oferece também informações muito úteis. Avaliar a governança corporativa, fatores operacionais e vantagem competitiva é extremamente importante.
Por fim, a análise fundamentalista é bastante acessível, extremamente valiosa e você não precisa de um elevado conhecimento em finanças para obter uma compreensão básica.
Bons investimentos!
Leitura recomendada
- Warren Buffet e a Análise de Balanços, 1ª ed, 2008 – por Mary Buffet e David Clark
- A Interpretação das Demonstrações Financeiras, 1ª ed, 2012 – por Benjamim Graham
- Análise das Demonstrações Contábeis, 8ª ed, 2019 – por José Carlos Marion
Fontes de consulta
- https://en.wikipedia.org/wiki/Fundamental_analysis
- http://www.investopedia.com/terms/f/fundamentalanalysis.asp
- http://www.euroinvestor.com/ei-news/2012/02/12/stock-school-5-important-elements-in-fundamental-analysis/15694
Por que usar análise fundamentalista?
Ao analisar os relatórios financeiros das empresas, você terá uma compreensão do valor de diferentes empresas. Depois de analisar esses fatores você poderá ter uma melhor compreensão se o preço do ativo estará subavaliado ou sobrevalorizado ao preço de mercado atual.
Como fazer análise fundamentalista?
- Compreenda a empresa, suas operações, modelo de negócios, etc
- Use os índices financeiros para a triagem inicial
- Estude atentamente os relatórios financeiros da empresa
- Encontre os concorrentes/rivais da empresa e estude-os
- Verifique o endividamento da empresa e compare-o com os concorrentes
- Analise as perspectivas da empresa
Qual a diferença entre análise fundamentalista e análise técnica?
A análise fundamentalista busca fazer uma estimativa sobre os fluxos de caixa de uma empresa com base em como a economia, a indústria e os negócios da empresa. Com isso, o investidor tem uma ideia de quanto vale a empresa/ação. Por outro lado, a análise técnica analisa os dados do mercado, como preço e volume de negócios. O foco da análise técnica está na identificação de padrões e tendências que se repetirão com base na lei da oferta e da demanda.
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